terça-feira, 23 de fevereiro de 2010
Horror! Relato de um viajante acompanhado do filho de 5 anos na Supervia carioca
Foto - Os trens das "Supervias"
de alguns países da europa.
Caminhamos para as plataformas para pegar qualquer trem que estivesse saindo. Andaríamos apenas duas estações e todos passariam por elas. As saídas para Belford Roxo já estavam encerradas. A próxima saída anunciada era dentro de meia hora, às 16:30h, para Santa Cruz. Eu acho que santos são os passageiros pela penitência cotidiana. O trem era velho e sujo. Com muito lixo pelo piso. Um calor infernal e começou a entrar gente. Pessoas pobres, crianças, jovens e de meia idade. Mas, todos com caras cansadas e falta de esperança no olhar.
O meu filho que nunca vira a miséria de tão perto – porque tem apenas 5 anos - começou a perguntar porque o tem era tão velho. Porque ele era tão quente. Porque era tão sujo. Em seguida começou a perguntar porque o metrô tem ar condicionado e para aquelas pessoas não tem. Dei respostas evasivas. Não tive coragem de dizer para ele, naquele momento, que aquelas pessoas que são transportadas naquele trem sequer são tratadas bestializadamente. Pois, aos animais se transportam com maior conforto e segurança porque têm valor econômico.
Às 16:25 meu filho começou a se impacientar. Eu já estava impaciente há muito tempo, apenas procurava fazer com que nossa aventura fosse a menos desconfortável possível. Espliquei ao meu filho que o trem sairia em 4 minutos e ele quis saber quanto eram 4 minutos. Sugeri a ele contar até 60 por 4 vezes. Deu certo. Enquanto contamos deu 16:30h. Disse ao meu filho que a qualquer momento o trem partiria. Mal acabei de dizer e o trem anunciou a partida. Pelo menos houve pontualidade. Meu filho pôs-se na janela, em pé sobre o banco, e me mostrava os pontos da cidade que continua maravilhosa, na medida que os reconhecia.
Chegamos à estação de São Cristóvão. Umas pessoas que estavam sentadas próximas à porta não se deslocaram para que pudéssemos descer. Passamos sobre suas pernas e cheguei a esbarrar meu pé numa delas. Pedi desculpas, reconhecendo que seria demais esperar que uma pessoa que nada recebe pudesse ter a gentileza de se levantar ou arredar-se da porta para possibilitar o desembarque de um sujeito branco, notoriamente de classe média, com seu filho arrumadinho no universo dos excluídos. Como esperar qualquer generosidade ou respeito de quem só apanha, inclusive com chicotadas dadas pelos seguranças da empresa ferroviária?
O trem fechou as portas e partiu. Parecia um milagre. Coisa de Santa Cruz. Todas as portas se fecharam, partiu sem solavancos e com o maquinista na cabine. Meu filho pediu para ficar na estação olhando sua saída. Ficamos. O trem sumiu nos trilhos. Acho que foi para o Paquistão ou para a Índia. As pessoas que ele transportava eram muito parecidas com as daqueles países. Acho que eram párias. Vestiam-se com cores escuras e suas peles não eram claras. Não muito escuras. Mas, encardidas.
João Batista Damasceno.
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