Depoimentos de testemunhas ouvidas pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), a que a Agência Pública teve acesso, registram que o Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, teria ligado em “entre 2015 e 2016” para o então governador Pedro Taques (PSDB) para questionar uma fiscalização ambiental em suas fazendas localizadas dentro de uma Unidade de Conservação de Diamantino, sua cidade natal no Mato Grosso.
Ainda segundo os depoimentos, Mendes também teria ligado para o corregedor do Ministério Público Estadual, Flávio Fachone, para pedir providências contra o Promotor que o investigava.
Processado pelo MP sob alegação de uso irregular de agrotóxicos dentro de uma unidade de conservação (UC) do município de Diamantino, o Ministro Gilmar Mendes ingressou com um processo contra o Promotor de Justiça da cidade, Daniel Zappia (foto), no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
A titular da Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Ana Luiza Peterlini, também teria recebido um telefonema do Ministro, confirmado por ela à Pública, e uma visita do advogado de Mendes para tratar da situação ambiental de uma de suas fazendas.
O caso, que vinha sendo investigado pela Pública desde janeiro, também foi tema da última edição da Revista Crusoé, na sexta-feira (9).
Mendes tem pelo menos três fazendas dentro da Área de Proteção Ambiental (APA) das Nascentes do Rio Paraguai, que tem 77.443 hectares e, como o nome diz, abriga a nascente do Rio Paraguai. Por ser uma UC de uso sustentável — a categoria menos protegida pela legislação — a atividade agrícola é permitida no local, desde que não coloque em risco as nascentes e cursos d’ água, conforme consta no decreto de criação da APA. Além disso, outro decreto estadual, de 2013, proibia o uso de agrotóxicos em qualquer UC do Mato Grosso.
Segundo vistorias da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema) realizadas em 2016, a pedido do Ministério Público Estadual (MPE), das três fazendas de Mendes, duas descumpriam a legislação. “Na área em questão é realizada a aplicação de agrotóxicos na lavoura aí explorada. A providência tomada neste momento […] foi notificar para a retirada dos agrotóxicos da área e concomitantemente repassar ao responsável a impossibilidade de uso de agrotóxicos dentro da área da APA das Nascentes do Rio Paraguai”, escreveram os fiscais após vistoriar a Fazenda Rancho Alegre, de 611 hectares, onde Gilmar Mendes plantava milho e soja. Na propriedade São Cristóvão, de 760 hectares, os fiscais flagraram diversas irregularidades, como “a ausência de outorga para captação de água superficial perante a margem esquerda do Rio Melgueira e utilização indiscriminada de agrotóxicos”. O uso irregular de pesticidas também foi verificado na Fazenda Jataí, que pertence ao cunhado de Mendes, Ailton Alves França.
No total, o MPE identificou 27 propriedades dentro da APA na mesma situação — duas fazendas de Mendes e outra de seu cunhado.
Conforme consta no inquérito civil aberto para investigar o caso, o Promotor Daniel Zappia propôs Termos de Ajustamento de Conduta aos proprietários, caso de Mendes. Nos acordos, eles se comprometeriam a reduzir gradualmente a quantidade e a toxicidade dos venenos utilizados. Ainda segundo os autos, Zappia ingressou com ações civis públicas na Justiça de Diamantino contra os produtores rurais após as tratativas não darem certo.
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