Ao apelar para o aumento dos recolhimentos compulsórios sobre depósitos bancários à vista e a prazo, a autoridade monetária tomou medida que revela sua preocupação com a disparada dos preços nos últimos meses e, ao mesmo tempo, com o constrangimento de ter de voltar a aumentar a taxa básica de juros (Selic) no fim do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) faz sua última reunião do ano (e da atual diretoria) na semana que vem – terça e quarta-feira – e não seria tecnicamente defensável deixar de aprovar uma elevação de pelo menos 0,5 ponto percentual.
A saída do aumento dos compulsórios é clássica. Havia espaço para adotá-la e, por ser medida que não deixa de causar dor, só mesmo o calendário eleitoral parece explicar a demora em adotá-la.
No pico da crise mundial do crédito, iniciada em setembro de 2008, uma das medidas adotadas pelo BC para garantir a oferta de dinheiro pelo sistema bancário foi a drástica redução dos percentuais do compulsório, liberando R$ 100 bilhões dos quase R$ 250 bilhões retidos.
Mas o país já retomou, há meses, o dinamismo da atividade econômica e a maior parte dos setores opera nos patamares anteriores à crise. Este ano, o consumo interno vem apresentando expansão em ritmo frenético, movido mais pelo crédito farto e pela valorização da moeda do que pelos ganhos reais de renda. Ao andar mais rápido do que a capacidade de produção, o consumo das pessoas e do governo acabou configurando uma pressão de demanda, que, ao persistir, provocou inflação. A disparada dos preços só não tem sido mais grave graças ao crescimento acelerado das importações de bens de consumo (US$ 17,3 bilhões em novembro, 40% maiores do que as de outubro). Desde abril, o BC vem reduzindo gradualmente essa liberação, mas ainda havia saldo de cerca de R$ 70 bilhões, o que explica os percentuais de aumento dos depósitos obrigatórios adotados ontem, destinados a retirar R$ 61 bilhões da economia.
Com isso, o BC está reduzindo a oferta de dinheiro na praça e, é claro, provocando o encarecimento geral do crédito, para baixar a febre do consumo, na expectativa de não aumentar a já excessiva atração que os juros brasileiros exercem sobre os especuladores internacionais. Mas essa medida pode não ser suficiente. Consumidor voraz, o brasileiro tende a assumir compromisso, desde que a prestação caiba em seu salário.
Principal motor da moderna economia, o crédito ao consumidor, que sempre foi muito contido no Brasil – na maioria dos países desenvolvidos, costuma ultrapassar os 60% do Produto Interno Bruto (PIB) e aqui mal chega a 40% –, em boa parte, por causa de décadas de instabilidade monetária, retomou o crescimento acelerado de antes da crise. Este ano, a expansão do crédito está em marcha batida, na base de 25% sobre os financiamentos concedidos em 2009, velocidade três vezes maior do que do crescimento da economia.
Ontem, pela primeira vez, o presidente do BC, Henrique Meirelles, usou a expressão “bolhas no mercado de crédito”, fazendo lembrar os excessos que provocaram a crise dos bancos nos Estados Unidos e na Europa. Talvez seja hora de limitar os prazos. Para haver exageros, que seja de precaução.