O eleitor brasileiro acaba de ganhar mais um motivo para se decepcionar com os representantes que elegeu para cuidar de seus interesses em Brasília. Depois do festival de trapalhadas e da total incapacidade de cumprir seu papel, o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados ganhou novas regras de funcionamento que vão na contramão de qualquer expectativa de moralização da vida política do país, pelo menos no âmbito daquela Casa. Nem é preciso lembrar que o desgaste que o Conselho de Ética sofreu quando se descobriu seu presidente tinha construído um enorme castelo medieval no interior de Minas, para fins de exploração turística. De lá para cá, ninguém quis mais ser membro daquele órgão e não faltou quem sugerisse a sua desativação, para livrar os deputados do constrangimento de julgar e condenar colegas por falta de decoro parlamentar. Mas como os casos de envolvimento em falcatruas, propinas e recebimento de dinheiro sem registro para financiamento de campanha continuaram brotando por toda parte, era preciso dar uma resposta à sociedade e encontrar uma maneira de reerguer o Conselho de Ética .
A emenda veio muito pior do que o soneto. Quinta-feira, a Câmara dos Deputados aprovou – às pressas, já que se aproxima o julgamento da deputada Jaqueline Roriz (PMN-DF), filmada aparentemente recebendo dinheiro – um abrandamento no Código de Ética. Os deputados se queixavam que, pelas regras antigas, tinham poucas opções de penas a serem aplicadas, além da perda do mandato. Agora, a cassação só se dará em última circunstância. As alterações simplesmente atropelaram projetos que tramitavam na Casa, prevendo ampliar o enquadramento como quebra de decõro parlamentar. Ficou de fora, por exemplo, a não comprovação de evolução do patrimônio compatível com o cargo público e a fixação de limites entre a atuação parlamentar e os interesse dos financiadores de sua campanha. Também foram desconsiderados projetos que consideravam incompatível com a atividade parlamentar aceitar vantagens como viajar em avião privado pago por amigo ou empresa, bem como presentes e festas por empresários interessados em contratos com o serviço público.
Mas isso não é tudo. As mudanças no quadro de penas aplicáveis não são menos surpreendentes e contrárias à ideia de combate à impunidade dos poderosos. Agora, os membros do Conselho de Ética da Câmara dos Deputados poderão punir seus colegas que quebrarem o decoro parlamentar com advertência por escrito ou mesmo verbal. E, pasmem-se, para os casos graves, mas considerados não gravíssimos, está prevista a pena de suspensão por até seis meses, sem perda de vencimentos. Nesse período, o parlamentar condenado estará impedido de falar em plenário, apresentar projetos e participar das comissões, temáticas ou especiais. Em outras palavras, ele vai ficar impedido de trabalhar, mas não de receber integralmente seus vencimentos: será condenado a longas férias remuneradas. Se antes havia dificuldade em preencher os 15 lugares do Conselho, agora, abrandado o Código de Ética, a Câmara aprovou o aumento de assentos para 21. Os autores dessa façanha podem argumentar que o novo regulamento aumentou o número de casos que poderão ser levados ao Conselho. Mas eles que se preparem para a decepção geral da opinião pública quando aplicarem as penas suaves que criaram.